Meu nome é Isadora Williams, tenho 22 anos e represento o Brasil na Patinação Artística no Gelo. Fui a primeira patinadora a representar o país em uma edição dos Jogos Olímpicos de Inverno, em 2014, e a primeira a qualificá-lo à final olímpica nos Jogos de PyeongChang, em 2018. Bom, daí vem a pergunta: o Brasil é um país tropical, não tem neve, como pode participar de uma Olimpíada de Inverno? Saiba que há atletas que vivem no Brasil e competidores com dupla cidadania que optaram por representar o país de um dos seus pais em esportes de inverno.
Nasci nos Estados Unidos, na cidade de Marietta, no Estado da Geórgia. Sou filha de pai americano e mãe brasileira. Eu amo os Estados Unidos. Sim, fui criada, fui à escola e faço faculdade nos Estados Unidos. Mas também sou brasileira e amo o Brasil. A minha mãe é brasileira e não podemos esquecer das nossas raízes e de onde vieram nossas famílias. Cresci comendo comida brasileira, ouvindo música brasileira e recebendo familiares do Brasil na minha casa. Cresci respeitando e celebrando as duas culturas. Se não fosse pelo Brasil, minha família não existiria.
Uma parte de mim é brasileira e tenho conexões com o Brasil. Recebo mensagens lindas de brasileiros. Também recebo muitas críticas, dizendo que eu apenas uso o Brasil para chegar a uma Olimpíada, que não tenho talento para fazer parte do time americano, que não sou brasileira, etc. Não nasci no Brasil, mas sou brasileira nata porque sou filha de brasileira e a Constituição do Brasil me dá este direito. Eu não estou usando o Brasil, mas sim honrando o nome do país em uma Olimpíada de Inverno. Falo português com sotaque, mas tento melhorar e aprender mais, sempre! Um dia eu chego lá!
Comecei a patinar aos cinco anos de idade. O meu pai me levou para patinar por pura diversão e no rink estavam promovendo aulas para crianças da minha idade. Foi paixão à primeira vista! Eu simplesmente adorava as aulas de patinar. Eu tentei outros esportes como vôlei, natação e balé. Até que não era tão ruim, mas eu gostava mesmo era de patinar.
Em 2006, meu pai teve uma proposta de trabalho e mudamos para Washington DC. Fomo morar na região da Virgínia, cerca de 45 minutos da capital dos Estados Unidos. Fiquei sem patinar por um tempo até me adaptar com a mudança. Depois de alguns meses eu retornei à patinação, mas não era nada sério. Até que, aos nove anos, comecei a falar para minha mãe que queria representar o Brasil na patinação artística. ‘Por que o Brasil?’, ela disse. ‘Quero ser a primeira patinadora brasileira nos Jogos Olímpicos de Inverno’, respondi.
Era só um sonho no início e minha mãe não me levava muito a sério. Foi quando em 2010 comecei a treinar com um técnico russo e ele me incentivou. Descobrimos que o Brasil tinha uma confederação, a CBDG. Enviei um vídeo em 2011 e, na mesma semana, fui convidada a representar o Brasil internacionalmente. Em fevereiro de 2012 eu participei do meu primeiro Mundial Júnior, na Holanda, representando o Brasil. Em setembro de 2013 consegui a vaga olímpica pela primeira vez no Troféu Nebelhorn, na Alemanha.
"Cresci comendo comida brasileira, ouvindo música brasileira e recebendo familiares do Brasil na minha casa. Cresci respeitando e celebrando as duas culturas."
Os meus pais foram os meus maiores incentivadores. Esportes de inverno são caros, incluindo a patinação artística. Eles arcaram com todo o meu treinamento até pouco antes de conseguir a vaga olímpica para o Brasil – e ainda hoje arcam com algumas despesas. Recebo ajuda da CBDG, que paga parte do meu treinamento, e do Bolsa-Atleta do Ministério do Esporte, que uso para comprar equipamentos novos. Não tenho patrocínio e conto com a ajuda de alguns parceiros, como CPQi, que me deu o vestido do programa curto, a EDEA, que garantiu um par novo de patins, John Wilson Blades, com lâminas novas, e #HASH, que criou meu website.
Apesar de ter apenas 22 anos, percorri uma caminhada longa para chegar onde cheguei. Conciliava escola com treinamento, levantava de madrugada, às 4h30,pye para ir treinar e depois ir à escola – e tinha treinamento depois das aulas em três dias da semana! Por conta da intensidade dos treinos e dos custos, a minha família e eu não tiramos férias nesse período e minha mãe ficou sete anos sem ir ao Brasil.
Para finalizar, não vejo o esporte como algo profundamente político. Se optasse por representar os Estados Unidos e se tivesse tido uma chance seria legal também. Eu optei pelo Brasil porque tenho conexões com o Brasil e possuo família vivendo lá. Aos 22 anos, ainda sinto o mesmo orgulho e entusiasmo de representar o Brasil nos Jogos Olímpicos do que quando tinha nove anos! É isso o que importa!
Foto: Maddie Meyer/Getty Images