PRIMEIRA PESSOA

Amor, não tem comida para todo mundo

Frase dita pelo marido foi só parte do pesadelo vivido por Cintia Silveira Brígido no dia do casamento

query_builder 23 ago 2017, 21h25

Eu e meu marido namoramos por seis anos, noivamos e, quando marcamos a data do casamento, com dois anos de antecedência, começamos a fazer os orçamentos necessários para a festa. Nós nos casamos no dia 5 de outubro de 2013 e, como terminamos a faculdade nesse mesmo ano, abrimos mão do baile de formatura. Só pensávamos em juntar dinheiro para bufê, decoração, música, vestido, tudo como mandava o figurino.

Uma das minhas maiores preocupações desde o início foi garantir a qualidade do jantar. Na minha opinião, a noiva pode estar impecável, a decoração maravilhosa, tudo perfeito, mas, se a comida estiver ruim, com certeza as pessoas vão sair falando mal de tudo.

Na época eu trabalhava, e ainda trabalho, como diretora de convênios na prefeitura de Turvo (SC) e, portanto, a festa teria muitos convidados importantes da cidade: o prefeito, o vice-prefeito, vereadores. Fizemos questão de visitar pessoalmente cinco bufês da região para decidir qual iríamos contratar. Antes de batermos o martelo, fomos a dois eventos realizados pela empresa que contratamos e tivemos ótima impressão, a comida era muito boa.

Além da refeição, avaliamos a apresentação, o cardápio, observamos que os garçons estavam sempre uniformizados. Era um bufê que a gente contrataria só de olhar. Estávamos seguros de que tudo daria certo. Só não percebemos o fato de que os eventos visitados eram em geral para 100 pessoas, e nós tínhamos 520 convidados.

Fechamos o contrato, que previa uma entrada com coquetéis e canapés e, para o jantar , espeto corrido ( um rodízio de carnes) com filé mignon, picanha, carne de porco e de frango. Calculamos servir no mínimo 400 gramas por convidado, então pagamos por 230 quilos de carne. Também pedimos 35 garçons, pois a comida e a bebida seriam servidas na mesa do convidado e era preciso ter equipe suficiente para isso. Pagamos 14 000 reais à empresa.

O pesadelo começou já no serviço dos canapés: teve convidado que nem viu se eles foram servidos. Eu, a noiva, também não comi nenhum, mas, como estava envolvida com as fotos, não cheguei a perceber que havia algo de errado. Eu e meu marido entramos no salão, o pessoal aplaudiu e sentamos para começar o jantar. A cerimônia foi às 17 horas e pedimos que o jantar fosse servido às 19h30.

"Fiquei desesperada e comecei a chorar. Só conseguia ouvir os convidados gritando que queriam comer"

Percebi que a comida não chegava. Pior que isso, notei que as pessoas estavam impacientes, dizendo que estavam com fome, e eu não via garçons circulando. Os convidados começaram a bater os talheres nos pratos pedindo comida. De repente, vejo gente levantando das mesas e indo direto à cozinha para tentar pegar algo. Comecei a ficar nervosa e meu marido se levantou para ir até lá ver o que estava acontecendo.

Quando ele chegou à cozinha, viu que a quantidade de espetos não daria nem para metade dos convidados. A empresa levou somente 109 quilos de carne (comprovamos isso com a nota fiscal do fornecedor, quando entramos com o processo) e nós tínhamos contratado 230 quilos. Eles levaram menos da metade da quantidade de comida contratada. Meu marido voltou para a mesa e disse: “Amor, não tem comida para todo mundo”. Fiquei desesperada e comecei a chorar. Só conseguia ouvir os convidados gritando que queriam comer.

Meu marido queria pegar o microfone e avisar o que estava acontecendo. Foi nesse momento que eu fiquei em estado de choque e desmaiei. Não suportei o constrangimento, a vergonha. Jamais vou esquecer o que eu passei naquele dia. Minha família acionou uma ambulância, fui medicada ali mesmo e acordei algum tempo depois, disposta a dar a volta por cima e terminar a cerimônia da forma como eu havia sonhado. Felizmente a festa rolou até às 6 horas do dia seguinte. O café da manhã, agendado para o horário da saída, foi servido às 21 horas para tapear a fome dos convidados. E o meu álbum de fotos é uma tragédia, estou toda descabelada.

No dia seguinte eu fui direto à casa da dona do bufê, que me atendeu de pijamas sem ter noção do que havia acontecido. Ela pegou um talão de cheques e me ofereceu 2 000 reais para compensar o erro. Não aceitei. Não era justo, com todo o constrangimento que eu e meu marido sofremos.

Entramos na Justiça para pedir de volta o valor pago corrigido com juros e correção monetária, além de danos morais pelo que passamos. Na primeira instância, o juiz determinou uma indenização de 35 000 reais, mas eles recorreram e agora o Tribunal de Justiça reduziu o valor para 10 500 reais. É muito pouco, não cobre nem o valor que gastamos. Contratamos um serviço que não foi entregue, por isso vamos recorrer ao tribunal superior, em Brasília. Independentemente do valor que venha a ser estabelecido, esse é um dia que eu jamais vou esquecer na minha vida. O meu sonho se transformou num pesadelo.

Depoimento colhido por Fernanda Bassette
Foto por Stylo - Turvo/SC/VEJA.com