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Rodrigo Pacheco

'Um presidente denunciado é triste para a nação'

O presidente da CCJ da Câmara, que analisa a denúncia por corrupção contra Michel Temer (PMDB), diz que conduzirá processo com independência e que acusação precisa ser provada

Por João Pedroso de Campos

query_builder 7 jul 2017, 20h30

Em seu primeiro mandato na Câmara dos Deputados, o deputado federal Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), 40 anos, é presidente da mais importante comissão da Casa: a de Constituição e Justiça (CCJ), colegiado de 66 deputados pelo qual passam, necessariamente, todos os projetos legislativos. Advogado, Pacheco também é o responsável por conduzir, na CCJ, a apreciação da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o presidente Michel Temer (PMDB) por corrupção. Embora classifique o momento como “triste” e “constrangedor” para o país, o peemedebista mineiro se declara independente do Palácio do Planalto e indicou para relator da denúncia o deputado Sergio Zveiter, também do PMDB e igualmente insubordinado ao governo Temer. Nesta entrevista a VEJA, Rodrigo Pacheco garante não abrir mão da autonomia “nem se oferecessem dez ministérios para Minas Gerais”, critica as delações “premiadíssimas” da JBS e defende as reformas trabalhista, previdenciária e política.

Como avalia o conteúdo da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o presidente Michel Temer (PMDB)? A narrativa da denúncia imputa um fato grave em relação ao presidente da República. No entanto isso, por si só, não serve para formação, ou não deve servir à formação do juízo de convencimento, seja dos deputados, seja dos ministros do Supremo, porque isso tudo tem de ser analisado à luz da prova do inquérito policial e sempre buscando informações na defesa escrita do presidente da República.

O senhor disse que é “constrangedor” para os brasileiros ter um presidente da República denunciado. Temer deveria ter renunciado antes da denúncia? Não necessariamente. Se o presidente se considera inocente, não pode sucumbir a uma pretensão do Ministério Público a ponto de renunciar. Tem de buscar demonstrar sua inocência, assim como o Ministério Público tem de buscar demonstrar culpa se presume que ela existe em relação ao presidente. Quando eu falei de constrangimento, é porque, de fato, se trata um episódio triste da nação, que coloca a instituição Presidência da República em xeque através de uma denúncia criminal.

O senhor tentou pautar na CCJ a PEC da eleição direta, mas ela ainda não foi apreciada. A aprovação dessa PEC seria uma boa solução para a crise política? Não será uma saída para essa crise momentânea porque, ainda que houvesse a vacância da Presidência da República por qualquer motivo, não seria possível, em termos de tempo, aprovar uma PEC das Diretas a ponto de ela servir para aplicação imediata em eleições deste ano. Essa PEC, ainda que importante e válida sob o ponto de vista de conveniência, seria para mudar a Constituição para eventuais crises futuras, não para esta.

Em caso de uma eleição indireta, o senhor vê consenso em torno de algum nome na Câmara? Não vejo consenso em relação a isso pelo simples fato de que não vejo movimentação nesse sentido na Câmara. Neste momento, não se fala a respeito disso. As energias estão concentradas na admissão da denúncia do presidente.

O senhor recebeu pressão do presidente, de emissários do Planalto ou do PMDB na indicação do relator da denúncia? Desde o primeiro momento, disse publicamente que não aceitaria nenhum tipo de interferência na escolha do relator. Talvez isso tenha inibido qualquer tipo de pressão. Houve sugestões, houve opiniões, mas eu não interpretei como pressão em hipótese alguma. É natural que haja especulações, mas fiz valer aquilo que era uma prerrogativa exclusivamente minha: escolher um relator que tenho certeza de que será isento na condução dessa matéria.

As sugestões partiram de quem? Colegas? Ministros? Sugestões de deputados, com os quais a gente convive e conversa cotidianamente na Câmara, sobre preferências da base do governo e preferências da oposição.

“É um episódio triste da nação, que coloca a instituição Presidência da República em xeque através de uma denúncia criminal”

Sergio Zveiter (PMDB-RJ) é amigo de longa data de Rodrigo Maia (DEM-RJ), que assume a Presidência caso Temer deixe o cargo. Ele seria mesmo o relator mais isento? Eu presumo que ele seja amigo também, no Rio de Janeiro, de pessoas vinculadas ao governo. Então eu desconheço essas relações de amizade do deputado Sergio Zveiter, inclusive da relação dele com Rodrigo Maia. O que pautou [a indicação] foram os predicados dele de independência nas posições que tem na Câmara, o fato de ser advogado e ter sido presidente da OAB do Rio de Janeiro. As relações de amizade que ele possa ter no Rio de Janeiro não me pautaram em hipótese alguma, até porque não as conhecia.

O senhor teme retaliações do governo e do PMDB por sua atuação independente na CCJ? Ninguém pode temer retaliação de ninguém quando faz a coisa certa. Tenho plena consciência de que estou fazendo a coisa certa a serviço do país e da Câmara. Tenho a absoluta consciência tranquila em relação a isso.

De que forma a prisão do ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB) pode impactar a decisão da CCJ e a da Câmara? A responsabilidade nos impõe que o juízo sobre a possibilidade ou não de o presidente ser processado deve ser feita a partir da denúncia que foi formulada pela Procuradoria-Geral da República, das provas do inquérito da Polícia Federal, da defesa do presidente e das discussões que os deputados terão na CCJ. Mas pode ser que algum fator externo desses possa influenciar, para o bem ou para o mal, o juízo dos deputados.

Nos últimos dias se noticiou que a nomeação do presidente de Furnas seria uma forma de o Planalto agradá-lo. Houve alguma indicação sua ao cargo? O que existe é uma indicação de muito tempo do presidente de Furnas pelo PMDB de Minas Gerais. É inusitado que se tenha colocado essa discussão em pauta neste momento. Nenhuma dessas discussões sobre espaços políticos no governo federal vai interferir no trabalho da CCJ. Não arredo um milímetro das minhas posições independentes, jurídicas e seguras em relação à condução dessa matéria. Nem que se oferecessem dez ministérios para Minas Gerais neste momento eu mudaria de posição em relação a meus critérios de independência.

Alguns auxiliares do presidente atribuem sua independência do Planalto a pretensões eleitorais em 2018. Há fundamento nisso? Jamais me utilizaria de uma denúncia criminal contra uma pessoa como alavancagem política eleitoral. Além disso, não é momento de discutir eleição de 2018, até porque para chegar a 2018 temos de passar por 2017. Tenho responsabilidade para separar as coisas e, no momento oportuno, vamos discutir eleição em 2018. Esse momento não é agora.

O senhor foi candidato a prefeito de Belo Horizonte no ano passado. Cogita uma candidatura a governador de Minas Gerais? Especialmente neste momento, em que enfrentamos essa discussão aqui na Câmara, isso é algo que eu não estou tratando. No momento oportuno, eu vou pensar a respeito, mas se eu disser que não tenho sonho de ser governador de Minas Gerais, agora ou no futuro, eu estaria mentindo.

O senhor foi cotado para substituir Alexandre de Moraes no Ministério da Justiça, mas quem acabou nomeado foi Osmar Serraglio (PMDB-PR), que ficou três meses no cargo. Teve algum ressentimento por não ser o escolhido? Nenhum ressentimento. Disse isso pessoalmente ao presidente, que nunca me convidou para ser ministro, nunca teve nenhum tipo de compromisso comigo. Eu sempre reconheci que o posto de ministro da Justiça não poderia ser preenchido por critério político, partidário ou de estado da federação. É uma escolha pessoal do presidente. Ele optou por fazê-la e eu sempre respeitei essa posição. Reconheci que o meu caminho mesmo era a presidência da CCJ.

“Qualquer pessoa que vier a ser presidente da República no futuro, seja qual futuro for, vai ter a obrigação de levar adiante essas ideias concebidas desse governo de agora [reformas], que são positivas para o Brasil nesse sentido”

O senhor já declarou que as delações premiadas podem acabar levando à impunidade. Como avalia o acordo entre os delatores da JBS e a Procuradoria-Geral da República? Eu sempre disse isso e repito quantas vezes for necessário. O instituto da delação é válido, precisa ser utilizado, mas vinha e vem sendo mal utilizado no Brasil em alguns momentos. Eu dizia isso muito antes de acontecer esse episódio da JBS, que acabou por demonstrar que a delação premiada pode ser realmente premiadíssima para aqueles que cometem crimes e ficam impunes.

Como vê a recente decisão do STF de impedir a revisão dos acordos de delação? Vi com naturalidade. As decisões do Supremo têm de ser respeitadas. Os acordos de delação concebidos pela PGR e homologados no STF têm de ser respeitados, ainda que possam parecer absurdos. Infelizmente, esse é o custo de viver no Estado Democrático de Direito.

O que achou da indicação de Raquel Dodge à PGR? Eu tenho dificuldade para opinar porque não conheço a procuradora Raquel Dodge, mas imagino que tenha sido uma escolha responsável, primeiro do próprio Ministério Público, que a colocou na lista tríplice, e do presidente Michel Temer. Desejo a ela boa sorte.

Há clima no Congresso para avançar com as reformas, sobretudo a da Previdência, em meio à crise política? As reformas, os projetos e as PECs de interesse da nação têm de continuar, e temos obrigação de aprovar. Mas não vejo ambiente neste momento para prosperar com a reforma da Previdência, até porque ela exige quórum de 308 deputados em dois turnos. Acho muito difícil, na prática, que ela possa evoluir, considerando o momento que estamos vivendo.

Qual seria o impacto da possível troca de presidente nas reformas e na economia? Qualquer pessoa que vier a ser presidente da República no futuro, seja qual futuro for, vai ter a obrigação de levar adiante essas ideias concebidas desse governo de agora [reformas], que são positivas para o Brasil nesse sentido. Já se entendeu que são necessárias mudanças no sistema previdenciário – não aquelas radicais no início da proposta do governo –, que precisa fazer uma reforma trabalhista, tributária e política.

Sobre a reforma política, que pontos precisam ser alterados? O que é possível que aconteça na Câmara é a manutenção do sistema proporcional como é hoje, com o incremento da aprovação da PEC que proíbe as coligações proporcionais, estabelece cláusula de desempenho para que os partidos tenham funcionamento e acesso a fundo partidário e cria o instituto da federação de partidos. Tudo isso é possível fazer para a eleição do ano que vem, é o que se está discutindo na comissão especial.

A volta do financiamento privado de campanhas é viável? Não acredito que seja possível, neste momento em que houve o estabelecimento de uma relação promíscua entre o setor público e o privado, que possam voltar as doações de pessoas jurídicas. O Brasil não tem maturidade neste momento para voltar a esse regime. Financiamento público seria menos nefasto no momento que a volta das doações de pessoas jurídicas.

Foto: Cristiano Mariz/VEJA.com