Trineto do fundador da Fiat e neto de Gianni Agnelli, responsável pela recuperação da companhia após a Segunda Guerra Mundial, John Philip Jacob Elkann, de 43 anos, preside o conselho da holding que controla os negócios da família, desde empresas de automóveis, como Fiat Chrysler e Ferrari, até sociedades de mídia, como The Economist, e a equipe de futebol italiana Juventus. Nascido em Nova York, o herdeiro foi escolhido pelo avô para comandar os negócios e, em 1997, então com 21 anos, assumiu seu primeiro cargo na diretoria da Fiat. Hoje está integrado a todas as empresas do grupo. Elkann afirma que o futuro da mobilidade traz desafios para o desenvolvimento de carros inovadores, sejam autônomos ou elétricos, fabricados de acordo com políticas menos poluentes. Além disso, o herdeiro da companhia, diz que, o que é capaz de estimular o consumo de notícias, é o bom jornalismo.
Como o senhor vê o futuro da mobilidade, em um momento em que os jovens perdem o interesse pela aquisição de carros? Desde quando os carros começaram a ser produzidos no final do século 19, houve um incrível crescimento de tecnologia e inovação. Neste momento, estamos vivendo uma nova transformação. E isso é muito bom e estimulante, para fazer carros que serão mais compatíveis com o meio ambiente. Temos carros elétricos, híbridos, a gás natural e, aqui no Brasil, a etanol. O mercado brasileiro tem uma política em relação ao respeito do ambiente com etanol muito inteligente. Além disso, é importante que os carros sejam mais jovens. O principal problema é o carro velho, por serem mais poluentes e menos seguros. As novas gerações de carros trarão um melhora para o ambiente. É normal o fato de termos menos jovens que estão dirigindo. E vai ocorrer um outro grande salto que serão aos carros autônomos. Já temos veículos assim circulando no Arizona, nos Estados Unidos. Todo dia pessoas andam com os nossos carros e não estão conduzindo. Assim, nós não estamos preocupados e pensamos que, os próximos anos, serão muito interessantes, com muita transformação. E as empresas de carros inovadores verão isso como uma oportunidade.
Como o senhor vê o mercado automobilístico daqui a dez, vinte anos? Será muito diferente de país para país, porque cada um tem uma política, cada um vai direcionar para o que for melhor para ele. O Brasil, por exemplo, tem o etanol. Outros têm energia elétrica, e vão preferir os carros elétricos. Outros têm o gás natural. Todos, porém, vão fazer políticas que sejam menos poluidoras.
O Brasil tem que seguir na linha do etanol? O país tem uma solução boa. Mas o problema é que tem de ter carros mais novos, que são mais seguros e menos prejudiciais ao meio ambiente. Além disso, o Brasil tem de melhorar o etanol, precisa eliminar água e torná-lo mais eficiente.
O senhor dirige? Quais carros gosta de dirigir? Sim, eu gosto. Se estou trabalhando e tenho de mandar e-mail, não dirijo. Mas, se estou com a minha família, sim. E são muitos os carros, de pequenos a grandes. Um pequeno que eu gosto é o Fiat 500, mas também uso Jeep Grand Cherokee, Alfa Romeo, Ferrari.
Existe uma crise de confiança em relação à desaceleração da economia global. Como está a demanda por Ferraris? O mercado está muito bom, não sentiu a crise. São 8 000 carros vendidos por ano. Apesar de ser um nicho pequeno, a Ferrari produz os melhores carros do mundo. E sempre existirão pessoas que vão querer esse carro, mesmo que alguma parte do mundo esteja em crise financeira. E é nessas horas que nascem as oportunidades para direcionar o mercado para os países que estão bem.
E no Brasil? A Ferrari não tem um grande mercado no Brasil, mas vai crescer. Cada vez mais as pessoas vão querer dirigir carros especiais.
"O Brasil tem de melhorar o etanol, precisa eliminar água e torná-lo mais eficiente"
O grupo Exor, a holding que controla os negócios da família Agnelli, tem investimentos em várias áreas, desde automobilístico a mídia e futebol. Tem algum setor que a companhia ainda não está presente, mas que pretende investir? Um segmento que temos observado é o de produtos de consumo. Pode ser na área de alimentação, vestuário. São empresas que podemos olhar no futuro. No momento, porém, não temos nenhuma negociação em curso. Nos últimos anos, fizemos um trabalho de consolidação. Estamos com quatro grandes negócios, que são a FCA (Fiat Chrysler Automobiles), a PartnerRE (de seguro e resseguro), a CNH (de máquinas agrícolas) e a Ferrari. Com o tempo, devemos ter uma quinta grande, que pode ser da área de consumo. Além disso, temos negócios menores, como o clube de futebol italiano Juventus e a revista The Economist.
E quais são os planos de investimento para o Brasil? Estamos anunciando no país o maior investimento que já fizemos desde quando inauguramos o polo fabril de Betim, em Minas Gerais, em 1976. (O plano anunciado pela Fiat prevê 16 bilhões de reais entre 2018 e 2024). E não somente em fábricas, também em tecnologia. Os carros desenvolvidos aqui têm design e engenharia brasileiros. Esperamos que, agora com as reformas que o Brasil quer fazer, o país possa aumentar a sua competitividade. Quanto maior a competitividade, mais os nossos negócios deixam de ser regionais e passam a abastecer outras partes do mundo. Assim, ajudamos o Brasil a ser um país mais exportador. E não somente de bens primários, de matérias-primas e grãos, mas também de produtos de maior valor agregado.
A economia brasileira não vive um bom momento, com alto desemprego e expectativa baixa de crescimento, além de uma grande insegurança em relação ao governo de Jair Bolsonaro. Como o senhor avalia a situação político-econômica brasileira? Temos muita esperança de que o novo governo vá conseguir fazer seu programa de reformas e ajudar o país a recuperar a competitividade e o crescimento. Numa economia que cresce, o emprego se cria. O Brasil é um país que tem muito potencial. Uma coisa importante é não olhar o amanhã, e sim mais longe. Para nós, ainda é um bom lugar para investir.
O grupo Exor investe em empresas de mídia em diversos países. Por que investir em jornalismo? O mercado vive um momento difícil, em que as pessoas compram menos jornais e revistas. Além disso, a publicidade diminuiu, principalmente devido ao Google e ao Facebook, que acabaram atraindo os anunciantes. Na Itália, fizemos um trabalho grande de consolidação do mercado. O nosso grupo é o maior do país, com 25% de market share, o máximo permitido pela legislação. Outro grande investimento que fizemos foi na The Economist. Com a crise, muitos países deixaram de ter um bom jornalismo e, por isso, acreditamos que, por ser em inglês, há uma oportunidade maior de mercado, global.
O grupo consegue ter lucro com o jornalismo? Com a consolidação que fizemos, reduzimos os custos e estamos tendo lucro. A Economist também está crescendo. Hoje temos 1,2 milhão de assinantes que pagam. Normalmente, as pessoas querem ser informadas, mas não pagam por isso. Todo mundo quer saber as notícias, mas não compra mídia. Hoje, as pessoas pagam pela Netflix, pagam pelo Spotify, mas são poucos aqueles que pagam pelo jornalismo de boa qualidade.
O que poderia ser feito para estimular as pessoas a pagarem pelo jornalismo? O bom jornalismo. É ele que vai estimular as pessoas a pagarem pela informação.
O grupo tem vários projetos de educação. Por que é importante investir nessa área? É preciso investir bem. Não é só uma questão de investir. Aprendi muito com o brasileiro Jorge Paulo Lemann, um dos fundadores do 3G Capital. É preciso saber estimular as pessoas para aprender. Se sabemos mais, fazemos coisas melhores. A educação permite que muitas pessoas possam multiplicar seus talentos. Se você oferece só educação e as pessoas não querem multiplicar os seus talentos, foi tempo perdido.
A Juventus, clube que também faz parte do grupo Exor, contratou Cristiano Ronaldo com a expectativa de que ele trouxesse o título da Champions League, o que não aconteceu. Ainda assim, o jogador dá retorno para o time? O Cristiano Ronaldo é um jogador incrível. Ganhamos o oitavo campeonato italiano seguido. E a Champions League é muito difícil. Estamos seguros de que ele terá um bom desempenho na próxima temporada.
"Quanto maior a competitividade, mais os nossos negócios deixam de ser regionais e passam a abastecer outras partes do mundo. Assim, ajudamos o Brasil a ser um país exportador de bens com maior valor agregado"
Uma estrela como ele consegue agregar valor para os produtos do clube? Cristiano Ronaldo ajuda a equipe a ser mais forte. E uma equipe mais forte vende mais.
A Juventus contrataria o Neymar? Estamos muito bem com os jogadores brasileiros na Juve, o Douglas Costa e o Alex Sandro. Temos um novo treinador e ele é o responsável para montar o time como quiser.
A Ferrari teve um papel tímido na Fórmula 1 nas últimas temporadas. A corrida ainda traz retorno financeiro? A Ferrari não faz anúncio, propaganda. A escuderia sempre foi para a companhia um investimento em tecnologia e em publicidade. Hoje ela se paga. A empresa tem o objetivo de fazer bons carros, e o do ano passado era bom e o deste também. Estaremos competitivos.
Foto: Washington Alves